quarta-feira, 17 de maio de 2017

LITERATURA - MACUNAÍMA - COM GABARITO

MACUNAÍMA
          Mário de Andrade

        No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma.
        Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Se o incitavam a falar exclamava:
        --- Ai! Que preguiça! ...
        E não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, Trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente os dois manos que tinha, Maanape, já velhinho, e Jiquê, na força de homem. O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vivia deitado mas se punha os olhos sem dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus. Passava o tempo do banho dando mergulho, e as mulheres soltavam gritos gozados por causa dos guaimuns diz – que habitando – água doce por lá. No mucambo se alguma cunhatã se aproximava dele para fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas graças dela, cunhatã se afastava. Nos machos guspia na cara. Porém respeitava os velhos e frequentava com aplicação a murua a poracê o torê o bacorocô a cucuicogue, todas essas danças religiosas da tribo.
        Quando era pra dormir, trepava no macuru pequenino sempre se esquecendo de mijar. Como a rede da mãe estava por debaixo do berço miava quente na velha, espantando os mosquitos bem. Então adormecia sonhando palavras feias, imoralidades estrambólicas e dava patadas no ar.
        Nas conversas das mulheres no pino do dia, o assunto era sempre as peraltagens do herói. As mulheres se riam muito simpatizadas, falando que “espinho que pinica, de pequeno já traz ponta”, e numa pajelança Rei Nagô fez um discurso e avisou que o herói era inteligente.
                                                                                               MÁRIO DE ANDRADE.

1 – O personagem do texto está inserido na galeria dos heróis tradicionais da nossa literatura? Justifique.
       Não, porque o herói tradicional típico é perfeito, idealizado.

2 -  O autor utiliza-se de expressões populares e vocabulário da língua tupi-guarani. Qual o objetivo que pretende alcançar? A que postulado modernista tal atitude estava relacionada?
       Valorizar a língua falada no Brasil. / Destaque à cultura brasileira.

3 – Uma das propostas do Modernismo brasileiro é a incorporação da linguagem coloquial à Literatura. Escreva duas passagens do texto que provem essa atitude artística.
       “Si o incitavam a falar...” / “Macunaíma dandava pra ganhar vintém.”



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