domingo, 16 de abril de 2017

CRÔNICA: ANTENA LIGADA - LOURENÇO DIAFÉRIA - LINGUAGEM INFORMAL E FORMAL- COM GABARITO

 CRÔNICA: ANTENA LIGADA  
Lourenço Diaféria

LINGUAGEM INFORMAL E LINGUAGEM FORMAL

         Troquei meu televisor em branco e preto por um televisor em cores com controle remoto, para facilitar a vida de meus filhos, que agora, sabem como é, época de provas, estão se virando mais que pião na roda. Imaginem que outro dia um professor teve a coragem de mandar meu filho gavião-da-fiel fazer um trabalho sobre o Sócrates.
         Fiquei uma arara.
         Em todo o caso, apanhei a revista Placar e recomendei que o garoto procurasse os arquivos esportivos da Folha e do Jornal da Tarde. Não é por ser meu filho, mas o guri caprichou do primeiro ao quinto.
         Tirou zero.
         Puxa, assim também é demais. Resolvi levar um papo com o professor, ver se não era perseguição. O professor foi muito gentil, porém ninguém me tira da cabeça que ele é palmeirense disfarçado de são-paulino. Garantiu-me que havia ocorrido um equívoco. O Sócrates que ele queria é um craque da redonda que tomou cicuta. Essa é boa. Por que não avisou antes? Como é que eu vou adivinhar que o homem andava dopado? Me manquei, mas o professor percebeu meu azedume. Disse que ia dar uma nova oportunidade. Falou e disse.
        Preveni meu garoto que ficasse de orelha em pé, lá vinha chumbo. Dito e feito. O professor, deixando cair a máscara alviverde, deu uma de periquito campineiro e pediu um trabalho completo sobre o Guarani.
        Deixa que eu chuto, falei a meu filho. Pode contar comigo na regra três. Eu mesmo cuido da pesquisa.
        Peguei a escalação completa do guarani, botei o Neneca no gol, fiz a maior apologia ao time da terra das andorinhas. Pra me cobrir e não deixar nenhum flanco desguarnecido, telefonei pro meu amigo Antônio Contente, que transa em assuntos culturais e conexos (como seja a imprensa) e pedi que me mandasse uma camisa oito autografada. Diretamente de Campinas e pelo malote.
         Não é pra falar, mas o trabalho escolar ficou um luxo.
         Sem falsa modéstia, estava esperando pro meu filho no mínimo aprovação com laude e placa de prata, pra não dize medalha de honra ao mérito.
         Pois deu zebra.
         Começo a desconfiar que o tal professor me armou uma arapuca e entrei fácil, como um otário. O homem deve ser primo de Dicá. Sabem o que mestre fez? Hein? Querem saber? Deu outro zero pro meu filho. O pior é que não devolveu a camisa autografada.
         Essa não deixei barato. Fui de peito aberto, às falas.
         Ilustre --- eu disse --- com perdão da palavra, mas que diabo de safadeza Vossa Senhoria anda armando pro meu garoto gavião-da-fiel? Então eu perco tempo, pesquiso, consulto a história gloriosa da equipe campineira, faço a maior zorra com o time do Brinco da Princesa, e o garoto ganha cartão vermelho?
         Que grande cínico! O homem me olhou com aqueles olhos de olheiras --- acho que tem almoçado e jantado mal, sei lá, dizem que professor padece um bocado --- coçou a cabeça, murmurou:
         --- Foi o senhor quem dez a lição?
         Fiquei meio sem jeito.
         --- Bem, fazer não fiz. Dei uma orientação didática. Pai é para essas coisas...
         Ele não se comoveu. Foi até rude.
         --- Se aceita um conselho, pare de dar palpite na lição de casa de seu filho. O senhor não conhece nada do Guarani.
         Falar isso na minha cara! Tive de aguentar calado. Nunca soube que no diacho do time campineiro figurasse a dupla Peri e Ceci. E com essa constante mudança de técnico, como podia sacar que o técnico atual é o Zé de Alencar?
         Tá bem --- eu disse --- não vamos brigar por tão pouco. O professor pode dar outra colher de chá ao menino
         Deu. O professor quer agora os capítulos completos de um romance, por coincidência com o mesmo nome do time de Caminas: o Guarani. É qualquer coisa com índio sioux que, de repente, se vê obrigado a salvar uma mulher biônica das águas da enchente. Deve ser telenovelas em cores. Mas só pra complicar a vida do meu filho, o professor não revelou o horário. Porém desta vez ele não me fera. Pela dica do enredo que deixou escapar, deve ser mais uma dessas sucessões de cenas de violência que a gente é obrigado a engolir todas as noites na televisão. Estou de antena ligadona meu chapa.
                                                                                                 DIAFÉRIA, Lourenço.
Entendendo o texto

1 – Esse texto é um bom exemplo de linguagem informal. Com que objetivo o narrador usou esse tipo de linguagem?
         O narrador quis adequar as falas à linguagem própria dos personagens, por isso usou uma linguagem informal, de acordo com as características do pai.

2 – Na sua opinião, a linguagem empregada no texto está adequada? justifique sua resposta.
         Resposta pessoal.

3 – Reescreva os trechos a seguir numa linguagem formal:
a)     “...sabem como é, época de provas, estão se virando mais que pião na roda.”
Sugestão: Naturalmente vocês entendem que, como estão em período de provas, eles estudam com uma dedicação incrível.

b)    “Um professor teve a coragem de mandar meu filho gavião-da-fiel fazer um trabalho sobre o Sócrates.”
Sugestão: Um professor pediu a meu filho, que é torcedor do Corinthians, para fazer um trabalho sobre o Sócrates.

c)     “Fiquei uma arara.”
Sugestão: Fiquei bastante aborrecido.

d)    “Preveni meu garoto que ficasse de orelha em pé, lá vinha chumbo.”
Sugestão: Avisei a meu filho que ficasse atento, pois algo inesperado poderia acontecer.

e)     “Essa não deixei barato. Fui de peito aberto, às falas.”
Sugestão: Esse fato me fez tomar uma atitude e conversei claramente, sem volteios.

f)      “Estou de antena ligadona, meu chapa.”
Sugestão: Estou prestando muita atenção, meu caro.

4 – Indique outras passagens no texto em que se empregou a linguagem informal.
       “Mas o guri caprichou(...)”; “Resolvi levar um papo(...)”; “(...) é um craque da redonda que tomou cicuta. Essa é boa”; “Me manquei (...)”; “(...) deixando cair a máscara alviverde, deu uma de periquito campineiro (...); “deixa que eu chuto (...)”; “(...) botei o Neneca no gol (...)”; “transa em assuntos culturais (...)”; “(...) ficou um luxo”. “Pois deu zebra”; “(...) me armou uma arapuca e entrei fácil”. “(...) faço a maior zorra”. “E o garoto ganha cartão vermelho?”; “(...) no diacho do time”. “(...) podia sacar que (...)”; “(...) dar outra de chá ao menino”; “(...) desta vez ele não me ferra”. “Pela dica do enredo(...)”.

5 – Além de usar gírias, a personagem empregou também diversos termos pertencentes ao jargão do futebol (termos tipicamente relacionados a esse esporte).
       De que maneira o emprego desses termos contribuiu para a construção do texto?
       A personagem preocupa-se de tal maneira com futebol que se tornou alienada de outros temas. O emprego do jargão reforça a apresentação dessa limitação.

6 – Agora, suponha que o pai decidisse redigir uma reclamação formal para o diretor da escola onde trabalha o professor de Português. Por meio de uma escrita cortês e formal, faça reclamações quanto ao nível de exigência do professor do menino, aproveitando certos elementos do texto.
        Lembre-se:
        - não use gírias;
        - respeite as regras de gramática determinadas pela norma culta;
        - não usa expressões típicas da fala (tá, né, etc.);
        - evite o jargão típico do futebol. Dê preferência a termos relacionados ao contexto (reivindicações de um pai a um diretor da escola).
        Resposta pessoal.

7 – Compare a linguagem empregada em seu texto e no de Lourenço Diaféria e explique que diferenças há entre ambos.
        Resposta pessoal.

8 – Como se pode definir, a partir do que você aprendeu, o que é linguagem formal e linguagem informal.
        Sugestão: na linguagem informal, o redator ou falante usa gírias, repetições, expressões coloquiais, contrações. Já na linguagem formal, o vocabulário é mais selecionado, não há repetições, não se empregam gírias ou termos chulos.

       

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